"Elvis" (2022), de Baz Luhrmann
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9.5

Onde: Cinemas

 

“Ooohhh my love, my darling, I hunger for your touch, a long lonely time”

“Romeu e Julieta” (1996), “O Grande Gatsby” (2013), “Moulin Rouge” (2001), “Elvis” (2022). Estórias de amor. Mas a última deveria ser escrita com H. Uma história sobre amor. E sobre a busca por imortalidade. Eu descobri na adolescência, em um momento e lugar que sua rebeldia, inovação, música e requebrado já não eram novidades, mas também se recusavam a fazer parte do chamado ‘establishment’. Elas simplesmente estavam ali, pois alguém havia pavimentado esse caminho sem pedir licença.

Sou artista, mas demorei anos para entender isso e me atormentei de raiva perguntando se certas pessoas foram destinadas à pedra da imortalidade. Isso não conta como spoiler, pois todos sabem que Elvis não morreu e sim “left the building”, mas no momento em que fazem a esperada transição para o artista, de Austin para Elvis, não só demorei para perceber, mas quando finalmente o fiz, ele estava sorrindo e feliz, essa parte é importante, ele estava sorrindo feliz, apesar das pílulas, álcool, morte, divórcio e da gaiola dourada em que o Coronel o mantinha, Elvis sorria, enquanto cantava. O amor de um artista por sua plateia, eis que vemos o amor de um homem pelo destino que traçou em sua direção.

UMA CARREIRA DEDICADA AO AMOR E À ARTE

Existe uma caricatura ali destinada aos que não são próprios do meio, mas me deixe te lembrar das palavras de Sean Penn: “é um lugar sujo, controlado por cafetões e prostitutas, onde boas pessoas morrem na praia, sem contar o lado negativo”. Decida onde viver, essa escolha é sua. Nesse momento da crítica, você se pergunta, “a que horas esse sujeito vai me falar se o filme vale ou não?” Vale.

Porém mais que isso, temos que entender e valorizar uma carreira que foi construída sobre amor, talvez o que mais nos falta hoje. Eu não sei o que você faz, mas sem arte não dá para viver e da arte não dá pra se viver nesse país. Melodia e letra deveriam ser mais rápidos que vodka com energético, definitivamente duram mais na sua cabeça antes dos trinta, e muito mais nos seus anos de arrependimento depois.

Deveria estar falando do filme sobre o qual estou escrevendo. Basicamente é a história do Elvis, o Rei do Rock. Morreu jovem, com 42, o que é jovem! Sanduíche de pasta de amendoim com banana era seu favorito (ele fritava o sanduíche #bebêqueroexperimentarsempastadeamendoinmascomchocolate). E cantava bem.

Não gosto de biografias, geralmente erram, tentam resumir em duas horas uma vida, se algum dia fizerem a minha, fumei maconha por duas horas. Na verdade detesto biografias, mas essa simplesmente adorei.

Baz Luhman não tenta reinventar a roda, mas ele a quebra, Desde o início, prova-se uma direção com um poder que não se via desde Moulin Rouge. Diretores e escritores vêm e vão, diferente de alguém que agarrou a pedra da imortalidade como Elvis e fez dela sua. Luhman desenhou sua carreira, ao lado de sua esposa (também diretora de arte, figurinista e produtora de seus filmes) e juntos decidiram contar tramas sobre amor, romântico como em Romeu e Julieta e Moulin Rouge, ou fraterno como em O Grande Gatsby.

Somos todos escravos dessa vontade e destes sonhos, vivemos e sangramos por eles, “estamos sempre em busca da luz verde ao final do píer”. Este é o lugar onde Luhman consegue se identificar com o Rei do Rock, um homem que amou seu público e sua música. O velho Buk um dia disse “encontre o que você ama e deixe lhe matar”. Elvis viveu assim. Não foram as drogas, frituras ou abusos que o mataram, foi o amor, um tipo que não cabe no peito e que precisa ser cantado, Nem que seja só por um momento. Sim, lembra mais um desabafo ou uma sessão de terapia.

A direção de Baz Luhmam é primorosa, assim como suas escolhas na edição, montagem e narrativa. Ótimo também é estarmos no ponto de vista do suposto ‘Coronel”, destaque para um Tom Hanks em seu eclipsado papel como Coronel Parker. O certo é que Austin Butler nos entregou o Elvis perfeito, dito de um homem que atearia fogo no oscar do Remy Maleck se aquilo queimasse, mas isso, será editado no texto provavelmente (não foi).

Existe imitação, atuação e personificação,  e podemos dizer que o trabalho primoroso de Butler se enquadra no último caso. Ele personifica a estrela. O filme é contado sob o olhar do Coronel, interpretado por um ator cascudo, com ampla bagagem para segurar um longa-metragem sozinho, mas a história é de Elvis e o jovem ator Austin Butler mostra com todas as nuances, olhares e ‘molejo’ que veio para ficar. Ele é Elvis Presley.

Catherine Martin faz um primoroso trabalho, como sempre, em sua caracterização de época e mesmo sem as pequenas cartilhas, identificaríamos claramente o passar das décadas, pelo figurino, cenário e a linguagem estética de produção. Poderíamos o classificar como musical? Talvez não, ele se encontra no fio da navalha nesse ponto. A recriação dos shows é feita meticulosamente, construída de forma a retratar fielmente a emoção e energia da época.

Concluindo, sendo fã ou não, assista no cinema. A experiência catártica deve ser compartilhada. E viva o Rei.