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É comum encontrarmos nas obras do sul-coreano Bong Joon-Ho o tema família e comentários sócio-políticos. Foi assim nos excelentes O Hospedeiro e O Expresso do Amanhã, em Mother – A Busca pela Verdade e na sua produção para Netflix, Okja.

Em Parasite, Joon-Ho alcança a perfeição com uma mistura de drama, suspense e comédia, ao abordar a trajetória da família Kim. Pobres e sempre arrumando uma forma de se dar bem, os Kim veem na família Park, que alcançou a riqueza há pouco tempo, sua oportunidade de um futuro melhor. Usando toda a malandragem e conhecimento adquirido em anos de trambiques, um a um, os Kim começam a entrar na vida dos Park. A coisa muda quando um intruso aparece em meio ao golpe, pondo em risco todo o plano.

É dentro dessa trama, que Bong Joon-Ho desfila todo o seu talento, tanto na escrita, quanto na direção, ao explorar a segregação social na Coréia do Sul, mas que é universal. O diretor mostra cada pedaço dos ambientes em que os personagens vivem, contrapondo o apartamento abaixo do nível da rua dos Kim, com a mansão dos Park, por exemplo. Além de uma casa de dois andares, ela ainda se encontra no alto de rua, em ladeira, de um bairro de classe alta e com escadas que levam até a entrada. A comparação não é sutíl.

O filme inicia com a câmera filmando a janela dos Kim e descendo ao nível onde os personagens vivem, mostrando o ambiente apertado, encardido, com grandes lixeiras do lado de fora e o recorrente bêbado urinando próximo à janela. Já na mansão, vidros, escadas, modernidade, uma trilha sonora angelical.

Também não são sutis as atitudes de ambas as famílias. Os golpes dos Kim são baixos. Sem pena, eles vão abrindo caminho para entrar na vida dos ricos, seja através de seus filhos ou dos serviços de luxo que os Park necessitam. Por outro lado, os patrões seguem a cartilha dos bonzinhos, mas que não deixam de enquadrar os empregados e destilar o seu preconceito velado.

Um dos maiores trunfos de Parasite é o seu elenco. Toda a família Kim é excelente e com um carisma que nos faz rir de situações grotescas. É o carisma e o senso de família que, por mais erradas que sejam as atitudes, tomamos parte e nos afeiçoamos pelos Kim. Há uma ternura e quase um senso de conto de fadas na tentativa de ter um futuro melhor. E quem mais se destaca é Song Kang-Ho, que faz o pai. Ele é o protagonista dos melhores diálogos e também o que transmite as emoções mais genuínas. Seja ao se dar bem, seja protegendo sua família, seja não aceitando ser tratado como um inseto.

A grande crítica do filme é sobre a sociedade em si, independente de classes. Quando os Kim e os Park passam a viver uma simbiose dentro da mansão, o conceito de sociedade vai ficando de lado e o título do filme faz mais sentido.

Através do cômico e do suspense, Bong Joon-Ho cria uma obra-prima. Nos faz questionar o quanto já estamos infectados com um vírus social. Seja ele idolatrando pessoas por sua riqueza estampada em capas de revistas, seja exigindo um serviço na madrugada ou mesmo roubando o wi-fi do vizinho. Em um momento ou outro já fomos Kim ou Park. No final, é o exagero das atitudes dos personagens e a catarse dos acontecimentos dentro da mansão que nos fazem achar que estamos longe daquela realidade.