Nicolas Winding Refn, na premiere de estréia de “Too Old To Die Young” em Cannes, disse que tratava este material como “um filme de 13 horas”, e não uma série de TV – pois para ele a TV morreu após o advento do streaming, e essas novas plataformas são a evolução da linhagem cinematográfica.
Refn partiu de uma estrutura irregular de temporada, com alguns episódios com duração similar a um longa-metragem, outros com duração de aproximadamente 1 hora, e curiosamente o derradeiro 10º episódio num formato de curta-metragem, com 30 minutos de duração.
A sinopse mais popularizada da obra é a seguinte: o detetive Martin Jones (Miles Teller), que leva uma vida dupla atuando também como matador do submundo do crime de Los Angeles, enfrenta uma crise existencial que o leva a mergulhar num mundo de muita violência e sangue. Porém, ela não é 100% fiel ao que a obra propõe de fato.
Na verdade, a série fala sobre o tempo. Novos tempos afligindo sobre o antigo, o tradicional, como uma virada da curva da história, e como a violência permeia a evolução da sociedade norte-americana. Vemos menções à conjuntura política atual dos EUA espalhadas por todos os capítulos, em discursos, noticiários, bandeiras pregadas na parede, e são bem embasadas nos conflitos e sentimentos dos protagonistas, sejam americanos ou mexicanos.
Cada episódio é uma espécie de capítulo, onde o roteiro de Refn e Ed Brubaker vai construindo a fogo baixo a composição de cada personagem, em cada capítulo. O ritmo e a estética dos últimos filmes do diretor dinamarquês, como “Drive”, “Só Deus Perdoa” e “Garotas de Neon” está presente também nesta série, e cada personagem possui o ar ciborgue e indiferente a tudo que ocorre ao seu redor, mesmo nas cenas mais viscerais de violência.
Outra característica bem interessante são as mise en scénes ao longo da série, onde a câmera se movimenta lentamente em 360° ao longo da cena, e os atores passam, ou permanecem estáticos, ou entram e saem do foco durante esse movimento contemplativo do ambiente. O uso da luz também é muito bem realizado pela fotografia de Darius Khondji, que coloca calor, frieza, medo, tudo usando bem a iluminação do ambiente e o jogo de luzes expostas.
Assim como David Lynch entregou talvez a melhor obra cinematográfica de 2017 com “Twin Peaks – O Retorno”, talvez Nicolas Winding Refn não chegue a tanto em 2019, mas com certeza trouxe mais uma obra de relevo pro catálogo da Amazon Prime Vídeo.