Onde: Cinemas
O dia 28 de agosto de 2020 pegou o mundo de surpresa. O anúncio da morte de Chadwick Boseman estourou a bolha da cultura pop e foi lamentada por todos. De Obama, Oprah e todos os atores do Universo da Marvel nos cinemas até adultos, jovens e crianças que se encantaram com T’Challa dois anos antes. Todos choraram a morte do ator. Após o luto, a pergunta que ficou no ar era: e agora? Seria o fim do Pantera Negra, um dos maiores fenômenos culturais da última década?
Ryan Coogler, diretor e roteirista do primeiro filme, já estava com a história da continuação praticamente pronta quando tudo aconteceu. Algum tempo depois, ele anunciou que recomeçaria a escrever a história do zero ao lado de Joe Robert Cole, também roteirista do primeiro. Com a nova versão em mãos, a produção teve que lidar com a pandemia, declarações vergonhosas de Letitia Wright, maior cotada para assumir o manto do Pantera, em um discurso anti-vacina e acidentes no set.
Mas a boa notícia é que: Pantera Negra: Wakanda Para Sempre é um grande filme.
A premissa coloca Wakanda para lidar com a morte do rei T’Challa e as consequências tanto da sua perda, quanto da abertura da nação africana para o mundo, como vimos no final do primeiro filme. Além disso, uma outra civilização procura os wakandanos para pedir ajuda contra os exploradores. É aí que entra em cena o mais novo personagem da Marvel nos cinemas e um clássico dos quadrinhos: Namor.
Pantera Negra: Wakanda para Sempre é o filme mais adulto do MCU desde, olha só, Pantera Negra, de 2018.
É um filme sobre perda e sobre luto. A perda é um sentimento recorrente em todos os três atos do filme e ela não se reflete apenas pela morte de T’Challa. Ela é uma consequência de todas as mudanças que ocorreram em Wakanda desde os acontecimentos envolvendo Killmonger (Michael B. Jordan). A abertura econômica-tecnológica que o próprio T’Challa se prontificou a fazer após o embate com o antagonista muda completamente a forma como o mundo enxerga Wakanda e o relacionamento da nação com suas fronteiras e maior riqueza, o vibranium.
Ryan Coogler consegue criar uma história que mais uma vez envolve temas pertinentes ao mundo atual, como as guerras promovidas por grandes nações há oceanos de distância de seu território e a exploração a qualquer custo de recursos naturais.
É nesse cenário que conhecemos Namor, líder do povo de Talokan, império subaquático que descende dos Maias. E é preciso dizer que o contexto histórico que é apresentada a origem de Namor e do seu povo é um dos grandes momentos da Marvel no cinema. É poético, dramático, bem fotografado e com todo um cuidado que parece faltar em algumas das produções do sistema fordista com que o estúdio vem trabalhando nos últimos anos. Além disso, a escalação de Tenoch Huerta Mejía é precisa – coisa que a Marvel parece ser a melhor no cinema atual.
O perigo de Namor ser uma nova versão de Killmonger era gigante. Entretanto, há uma diferença fundamental entre os dois. Killmonger era uma força imparável, criada a partir de erros de Wakanda e do mundo, mas que se mostrou um tirano no fim das contas. Namor é um político, um governante que faz tudo o que for preciso para defender o seu povo. A sua origem está ligada diretamente com a criação de Talokan e é seu dever proteger a paz dos seus habitantes.
A força que Namor representa é mais um reforço no sentimento de perda de Wakanda. Sem o Pantera Negra e as Ervas Coração que Killmonger queimou no primeiro filme, a nação africana consegue se impor ao mundo com as Dora Milaje, mas se vê de mãos atadas com a força que o “príncipe submarino” e Talokan conseguem exercer sobre seu território.
Ninguém consegue trabalhar melhor o sentimento de perda e luto em Wakanda para Sempre do que Angela Bassett. Ramonda é um colosso perante tudo que precisa enfrentar, seja como mulher, soberana ou a matriarca que perdeu metade da família nos últimos anos. Não me espantaria se Bassett estiver nas premiações de 2023.
Quem também é destaque absoluto da trama é Shuri, a irmã de T’Challa. Ao ver o filme, entendemos o porquê de a atriz não ter sido afastada da produção após as polêmicas. Shuri é a peça central que substitui T’Challa no roteiro que precisou ser reescrito. É ela que toma a frente da aventura para resolver questões com Namor e suas consequências para Wakanda.
Danai Gurira e Lupita Nyong’o também são figuras importantes na trama, abraçando de vez o poder das mulheres e inserindo ainda Michaela Coel, como Aneka, e Dominique Thorne, como Riri Williams, a Coração de Ferro.
Como bom filme de super-heróis, Wakanda para Sempre avança em relação ao anterior com ao menos duas grandes sequências de ação. Uma delas, protagonizada por Namor, sofre um pouco com o Volume, telão de LED que tem substituído o fundo verde em grandes produções. Mesmo assim ela não deixa de ser divertida e garantir momentos excelentes tanto para os Talokanil, quanto para os wakandanos. Há ainda as surpresas que a Marvel sempre guarda em suas produções, o “mistério” de quem vai assumir o manto do Pantera e claro, uma ótima cena pós-créditos.
A missão de Wakanda para Sempre era difícil. Como superar um fenômeno cultural, com três Oscars, mais de um bilhão em bilheteria e que teve um protagonista amado por todos e um antagonista reverenciado como o melhor do MCU até hoje?
A resposta veio não na tentativa de superação, mas de continuidade. No sentimento de que o Pantera Negra vive dentro dos wakandanos e no coração dos fãs da Marvel. A presença de T’Challa é sentida ao longo de toda a trama. A imagem de Chadwick Boseman inunda a logo da Marvel, como se todos o abraçassem por alguns instantes uma última vez.
Nos resta a certeza de que o grito de “Wakanda Forever” ainda vai ressoar por muitas salas de cinema.