Onde ver: Apple TV+
8Nota da Hybrido
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8.8

Quando vi os teasers, trailers e chamadas de The Morning Show, a primeira investida da Apple no mundo dos streamings de TV, obviamente fui fisgada. E como não ficar, vendo Jennifer Aniston, Reese Witherspoon e Billy Crudup no cenário de um telejornal matutino em rede nacional? Todo o investimento em elenco e produção obviamente fez subir horrores a barra da expectativa, mas os dois ou três primeiros episódios estavam mais para um belo novelão do que para a caótica efervescência da finada The Newsroom.

Ao contrário de The Newsroom, que focava no processo de produção, apuração, conflitos éticos e na notícia em si e tinha a redação e seus percalços (incluindo as relações pessoais) como pano de fundo, em The Morning Show estão em evidência justamente as relações interpessoais nos bastidores do programa. No centro de tudo, o escândalo envolvendo o agora ex-âncora do programa Mitch Kessler (Steve Carell), afastado por denúncias de comportamento sexual inadequado. Difícil não ceder à tentação de cravar que a narrativa da série se baseia no escândalo envolvendo Matt Lauer e seu The Today Show da NBC, em 2017, com pitadas inspiradas na repercussão dos casos envolvendo Bill Cosby e Larry Nassar.

Na ficção, além de lidar com as rebarbas do escândalo de seu co-hoster, Alex Levy (Aniston) precisa aproveitar o timing de sua renovação de contrato para se firmar como a principal figura do matutino tendo ainda que – a partir do acontecido – decidir e desenvolver a persona que ela deve incorporar no âmbito pessoal e ou mesmo diante das câmeras para a “família americana”. Logo de cara, já vemos que não sobrou nada de Rachel nessa Jennifer absoluta, séria e comprometida com uma personagem complexa e cheia, lotada, de camadas.

Além de Jennifer e Steve Carell – que luta para economizar nas caretas tal qual Jim Carrey no início de sua carreira dramática (ou será que, ao dar ao âncora ares de Michael Scott, Carell está tentando dizer que Mitch pode ser sim tão escroto quanto o notório gerente de vendas?) – temos uma Reese Witherspoon madura incorporando Bradley Jackson, uma jovem jornalista passional, questionadora e intensa, que a atriz constrói com óbvia competência e credibilidade. E a grande cereja do bolo no elenco é Billy Crudup, pleno, poderoso, com doses precisas de cinismo, ambição e empatia. Ele é o responsável por nos fazer amar e odiar o executivo Cory Ellison com todas as forças e protagoniza momentos chave da série. Jennifer, Reese e Billy formam o tripé que sustenta a série na arte dramática pura e aplicada, enquanto o roteiro tenta costurar um drama contemporâneo, que cresce em densidade à medida em que os capítulos avançam.

Talvez esse seja o ponto fraco de The Morning Show: demora um pouco para engrenar, até que nos cativa para só então irromper em arcos e dramas paralelos e terminando, enfim, de forma explosiva e deixando, porém, algumas pontas soltas que podem ser gancho para a próxima temporada. Ao tentar instigar o espectador com o principal gancho do drama (quem era ou não era conivente com o comportamento do abusador?) alguns arcos ficam erráticos e confusos na óbvia tentativa nos despistar sobre o real envolvimento e a intenção das personagens. Chegamos até a pensar que “o confronto” em si nunca chegaria mas, fazendo valer o fator errático e aleatório da narrativa, ele chega de forma brutal e surpreendente no último episódio, o único que realmente me arrebatou.