Josh e Benny Safdie nos últimos anos têm trazido filmes com estética realista, misturando atores com não-atores, e imprimindo na montagem um ritmo incessante da vida pulsante de Nova York através de protagonistas que vivem sob a camada de luxo da cidade e buscando seu lugar ao sol. Em “Jóias Brutas”, enxergamos esse novo padrão através de um prisma mais amplo que enfoca todo o sistema social em que vive o norte-americano.
Ao obter uma pedra de rara beleza da Etiópia através do submundo judaico das joalherias, Howard Ratner (Adam Sandler) enxerga nesse objeto o caminho para sair do buraco de dívidas e calotes que construiu ao longo do tempo através de apostas esportivas, e tenta concluir seu plano sendo perseguido por agiotas, fiadores e credores pelas ruas de Nova York.
Em paralelo, as relações sentimentais de Ratner são também conduzidas como apostas, seja na reconstrução de seu casamento, no estabelecimento de uma nova relação em paralelo com uma jovem amante, ou a cada tentativa de elo com seus filhos e parentes, sempre usados em algum momento como peças de novas apostas pela ânsia do protagonista em perseguir a grande vitória que una todas as peças.
O plano inicial da imersão na beleza da jóia descoberta na África que desemboca numa colonoscopia em busca de um câncer é uma boa metáfora da relação dos países desenvolvidos com os subdesenvolvidos em termos de matéria-prima e venda, onde a forma do astro da NBA, bem-sucedido porém negro e vindo da pobreza, enxergar a beleza da pedra e entender seu real valor ao largo do capitalismo que vende como o sucesso, a obtenção do lucro máximo a todo custo.
O que Howard persegue ao longo do filme nada mais é que o sonho americano que está fragmentado pelo desgaste do modelo capitalista, onde se lucra através das especulações sucessivas e intermináveis, e aqui a metáfora com a especulação financeira é aceitável analisando as últimas crises quando se vendeu subprimes a preço de ouro, colapsando o mercado financeiro.
Os Safdie assim colocam sua estética e seu estilo cinematográfico a favor da ansiedade pelo sucesso colocando suas câmeras nos ombros de um ansiolítico protagonista, interpretado de corpo e alma por um Adam Sandler possuído pelos objetivos de seu personagem e sua profundidade para além de sua busca através dos reconhecimentos que busca por trás dessa busca da grande venda de seu grande pote de ouro.
A trilha sonora ressonante ao longo do filme, a fotografia que explora cada nuance de Nova York do neón à sujeira de rua, e a montagem que emprega o ritmo necessário para imergirmos naquela situação faz de “Jóias Brutas” um filme que merecia muito ser visto na tela grande dos cinemas brasileiros. Mas que ganha as pequenas telas da Netflix, possivelmente ganhando mais espectadores que, quem sabe, visitem suas obras anteriores lançadas por aqui (“Amor, Drogas e Nova York” e “Bom Comportamento”) talvez ainda melhores mesmo sob espectro mais reduzido.