Algumas das maiores histórias contadas nos quadrinhos são de arcos fechados, lançados em sua maioria em edições únicas ou minisséries. Entre elas temos as obras-primas “Watchmen”, “V de Vingança” e “Piada Mortal”, todas escritas por Alan Moore, “O Reino do Amanhã”, de Alex Ross e Mark Waid, “Superman: Entre a Foice e o Martelo”, de Mark Millar e, claro, “O Cavaleiro das Trevas”, de Frank Miller.
“A Liga da Justiça”, de Zack Snyder, ou o “Snyder Cut”, é um bom exemplo de como o esquema autoral das “graphic novels” pode ser transposto para o cinema. O Snyder Cut é a versão do diretor para o filme lançado em 2017, que foi praticamente todo refeito por Joss Whedon, após o afastamento de Snyder por conta do suicídio de sua filha.
O novo corte de quatro horas que o diretor entrega, agora lançado diretamente no HBO Max, é melhor em todos os quesitos. Muito melhor. Há coerência na história, desenvolvimento dos personagens, de suas motivações, causa, consequência e, pasmem, Zack acerta a mão no tom do filme. É impressionante ver como cenas quase iguais das duas versões possam soar e ser apresentadas de formas tão distintas. Aqui, nem tudo são flores, mas quase tudo funciona.
A começar pelo Lobo da Estepe, que deixa de ser um vilão de filmes do início dos anos 2000, com a simples motivação de “dominar o mundo”, para ter um arco sobre traição e redenção em sua missão na Terra. Personagens como Aquaman e Flash só ganham com esse novo corte do filme. O primeiro está coerente dentro do tom Deus, marrento, galã e não incomoda. Já o segundo, deixa de ser uma figura irritante, para se tornar um garoto com poderes especiais no meio de Deuses. Até a forma de correr bizarríssima que o personagem tem no filme de 2017, não está presente aqui.
Entre a trindade principal, o Batman de Ben Affleck, um dos maiores acertos de Snyder na DC, continua roubando o show. Principalmente agora que há mais cenas com o excelente Alfred de Jeremy Irons. O carisma de Gal Gadot não salva a atriz de mais uma atuação qualquer coisa, entretanto, a forma épica como o diretor filma a Mulher Maravilha vale o show.
Já o Super-Homem, parece ser o personagem que Snyder menos curte no grupo. Seu tempo de tela não condiz com tudo o que esperávamos. O grande destaque dessa nova versão é sem dúvida o Ciborgue, personagem totalmente preterido na versão de Whedon. Aqui, ele ganha contornos dramáticos, um arco bem estabelecido e se torna o coração do grupo.
A Liga da Justiça de Zack Snyder é o capítulo final da minissérie que o diretor começou a contar em “Homem de Aço” (2013). É um final digno do carinho que ele sempre demonstrou ter pelos personagens, mesmo que seu olhar cínico, carregado de drama, luto e voltado para o fardo que esses novos deuses carregam, não tenha agradado a todo mundo. É perfeito? Não. Ainda há excessos, muitas cenas descartáveis, slow-motions sem fim, fan-services sem fundamento, mas no final das contas é uma obra autoral. Você nunca vai olhar para um filme de Zack Snyder e pensar: nossa, que coisa mais genérica. Isso o diretor não sabe fazer e nem ser. Seja para o bem ou para o mal.