A atriz vencedora do Oscar, Regina King (“Se a rua Beale falasse”, 2018), estreia como diretora com charme teatral em sua maneira de guiar a câmera. “One night in Miami” é um início promissor da cineasta. Regina realiza uma bela adaptação da peça de teatro escrita pelo roteirista Kemp Powers e consegue, como no teatro, permitir que seus atores guiem o rumo daquela vindoura noite de deleite. As discussões propostas em torno dos direitos civis conquistados são diversas.
A tal noite de deleite seria um fictício encontro cheio de ideias progressistas envolvendo gigantes lendas da história norte-americana. Regina coloca dentro de um quarto de hotel em Miami, na noite de 25 de fevereiro de 1964, o campeão mundial de boxe, Muhammad Ali (ainda Cassius Clay), um dos maiores nomes do Soul, Sam Cooke, o jogador recordista da NFL, Jim Brown, e o líder religioso, Malcolm X. Este encontro, ainda que no nosso imaginário, é inspirado em eventos reais.
A reunião se passa num período muito importante para a revolução cultural da sociedade americana. “One night in Miami” mostra o que as 4 lendas teriam tratado quando de fato se juntariam em Miami após a vitória chocante do desafiante Cassius Clay contra o então campeão mundial Sonny Liston, em 1964. Falaram de arte, de suas escolhas, religião, racismo, política e economia: um deleite.
Os 4 ícones tratam de sua importância, dos seus discursos e de seus papéis para o movimento dos direitos civis e para a conquista de igualdade dos negros nos EUA. Tal movimento é refletido, por exemplo, aqui no Brasil. Regina tem o controle total, firme e teatral, de tudo que se passa num ambiente apenas, como Sidney Lumet (“12 homens e uma sentença”, 1957) e Quentim Tarantino (“Cães de aluguel”, 1993) já fizeram com maestria.
Regina inicia a obra com os atores em seus ambientes, cercados de desilusões, sendo achincalhados por brancos. Ela controla bem demais essa surra de desigualdade usando o claro e escuro de sua câmera. Os seus ícones sempre posicionados no claro. Ótima ambientação. Reforçava aí a dimensão da reunião que aconteceria.
Contando com atuações características, perfeitas e vibrantes é possível jogar o filme pro alto e colocar os diálogos – muitas vezes – sob tensões acaloradas de pessoas extremamente geniosas, que convergiam em desejo. Destaque para a cena do telhado, em que Malcolm X palestra sobre o circo que o negro de destaque representava para o branco rico da sociedade americana. Regina encerra de maneira épica ao colocar Sam Cooke, à capela, cantando o que se esperava dele, o hino do movimento dos direitos civis: “a change is gonna come”, usada em várias obras de luta social. Obra forte para temporada de premiações.