Carla Nowak (Leonie Benesch ) é uma professora do ensino médio, recém contratada por uma escola que se declara progressista quanto ao método educacional. No que diz respeito à professora em si, logo vemos sua busca pela horizontalidade na relação com os alunos. Nos momentos em que a sala foge de seu controle e a hierarquia, implícita à sua posição, tem de ser efetivada, a condução se dá através de uma coreografia de palmas, puxada pela professora e executada por todos, cujo silêncio e lugar de fala são restituídos ao término.
Um ambiente promissor, caso a premissa se cumprisse. Não demora muito para sermos conduzidos à uma sala em que dois professores questionam alunos acerca dos constantes furtos ocorridos na escola. Os alunos, representantes da classe, são, apesar das pseudo-tentativas de impedimento por parte de Clara, coagidos a denunciar quaisquer atividades suspeitas de seus colegas, sem qualquer prova. A coação avança ao serem os alunos da sala, “voluntariamente”solicitados a mostrarem suas carteiras aos professores. O ato leva à carteira de Ari, um aluno, filho de imigrantes, que possui uma alta quantia de dinheiro.
A partir deste ponto, suspeitas de tornam verdades. Chamado junto aos pais para ser confrontado, logo a verdade se esclarece: o menino carregava uma quantia de dinheiro que havia sido dado por sua mãe, para comprar um presente.
A administração da escola, dotada de seu manto progressista, sustenta e justifica suas ações em prol do diálogo, do esclarecimento conjunto, ignorando todas as atitudes condenáveis durante seu procedimento de caça às bruxas.
Entretanto, tais atitudes não passam desapercebidas, nem pelos pais, nem por Carla, que por sua vez, enfrenta a animosidade da sala dos professores, já que sua reprovação aos métodos utilizados destoa da opinião majoritária dos demais.
Após observar uma professora furtando moedinhas do café, Carla decide usar seu computador para uma tocaia. Ela deixa seus pertences na sala dos professores e deixa seu computador gravando. Quando retorna, percebe que teve seu dinheiro furtado e ao assistir o vídeo, identifica a responsável apenas pela camisa, já que não é possível ver a totalidade da imagem da pessoa. Mais uma vez, a suspeita se torna verdade.
Ela tenta confrontar a responsável, em busca do “diálogo”, mas ao não obter a colaboração desejada, leva o caso à administração que, sem titubear, suspende a funcionária, que é também mãe de Oskar, um dos alunos de Carla.
A partir deste ponto, o caos, já em ebulição, explode de vez.
A situação foge do controle e o bullying, abuso e violência – física, moral e psicológica – se instauram.
Logo de início, o diretor, Ilker Çatak, destaca a relativização da verdade. Em uma época de cancelamentos, de validação de “julgamentos populares”, a verdade perdeu sua força resolutiva. Pouco interessa o fato e sua integralidade, ao passo de que bastam indícios para que se fundamentem julgamentos, pautados pelo preconceito e discriminação.
O diretor avança ainda a discussão ao colocar em pauta a transversalidade que rege as relações sociais como um todo, se referindo ao ambiente escolar como um microcosmo mundial, desmascarando a crueldade e gravidade das problemáticas que assolam as relações humanas.
Em muitas das cenas, é inevitável que venha à mente frases como “mas que criança folgada”, “porque ela não toma uma atitude, ela manda”. E é justamente esse o centro da provocação. Como formar uma sociedade esclarecida, empática, capacitada a identificar ambientes e situações de opressão – física e/ou moral – e se posicionar em face disso. E, por outro lado, como devem agir as pessoas em posição de poder, a fim de reconhecerem suas posições hierárquicas e utilizá-las de forma positiva.
A pressão e as consequências ecoam em Carla que, ao mesmo tempo em que identifica, dentro de seu juízo de valor, o que considera justo e correto, ainda assim, não consegue agir de forma efetiva.
Neste sentido, a oscilação entre a figura do oprimido e do opressor são constantes na narrativa do diretor, caracterizadas pela flexibilização dos valores humanos, ao passo em que todos agem em busca do“justo, correto”, cada qual sob seu próprio juízo de valor individual. É o indivíduo e a necessidade do exercício de uma individualidade que não aja de forma incompatível com a coletividade. Essa problemática, atual e universal, pode ser identificada no micro, como bem faz o diretor, seja através de uma mera discussão escolar; até o macro, como o caos de uma guerra xenófoba declarada.
Tudo, sem exceção, passa pela moral ou pela falta dela.
É um filme que começa de forma singela, talvez pela escolha de um ambiente de identificação, e que ao longo de seu desenrolar, se aprofunda em questões extremamente relevantes e infelizmente presentificadas de forma pulsante. Para ver e refletir.
A Sala dos Professores | Trailer Legendado | 29 de fevereiro nos cinemas
A maratona para o Oscar® tá on! ✅ A Sala dos Professores, o filme indicado ao Oscar® de Melhor Filme Internacional pela Alemanha, chega aos cinemas em 29 de fevereiro.