ANÁLISE: “Love, Victor” (1a. temporada)
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10.0

ONDE ASSISTIR: Ainda sem distribuidora no Brasil

Ainda inédita no Brasil, a série “Love, Victor” já provocou uma pequena polêmica antes mesmo da estreia. Inicialmente encomendado como um dos originais da Disney Plus, novo serviço de streaming da empresa do Mickey Mouse, o seriado migrou para o Hulu, do qual a Disney é sócia majoritária, por ser considerado “maduro demais”. A mudança poderia ter sido positiva se significasse que “Love, Victor” poderia ser mais livre para abordar assuntos típicos da adolescência em uma plataforma que não tem medo de ousar – vide o maior sucesso dela, “The Handmaid’s Tale”. O problema é que todos os episódios já estavam gravados – e isso fica bem óbvio no produto final.

Derivado da comédia romântica “Com Amor, Simon”, que foi a primeira comédia adolescente centrada em um casal gay a ser lançada em grande escala nos cinemas, “Love, Victor” parecia ir ainda mais além – um protagonista latino, com pais religiosos, e explorando a possível bissexualidade do personagem principal. Simon, do filme original, apareceria (apenas em voz) como conselheiro do novo protagonista, Victor, um adolescente lidando com a própria sexualidade em uma nova escola. Mas o resultado final fica muito aquém de qualquer expectativa.

O filme original tocou em questões centrais na vida sexual e romântica de um adolescente – questionamentos, preconceito, aceitação, etc, de uma forma divertida e interessante. Já a série pretendia ir mais a fundo ao retratar uma família tradicional cuja religião traria um conflito bem maior ao enredo. O preconceito que a comunidade latina sofre nos Estados Unidos e o fato de que a família não tem a mesma condição financeira dos colegas de escola seriam oportunidades perfeitas para o roteiro retratar assuntos importantes e atuais. Mas qualquer conflito incluído no programa parece se resolver em um rápido episódio. O resultado final ficou muito mais próximo de “High School Musical” do que de “Queer As Folk”, a emblemática série sobre 3 amigos gays, que durou 5 temporadas e é considerada um marco na televisão.

Como todas as produções da Disney, “Love, Victor” é absurdamente clean – em dez episódios, há apenas um palavrão, e existe uma atmosfera de perfeição – nenhum problema persiste por mais de um capítulo. É exatamente como assistir a qualquer seriado do Disney Channel. Isso não seria necessariamente um problema mas quando isso se une à falta de profundidade do roteiro, acaba virando um defeito.

Enquanto o filme foi injustamente acusado de tratar conflitos de forma superficial – já que era apenas um recorte específico de uma história positiva, assim como a maioria das comédias românticas, o seriado prometia justamente dar o espaço necessário para qualquer abordagem que havia faltado, com tempo suficiente em uma temporada inteira. E o maior problema é exatamente esse – a superficialidade. Victor é um jovem carismático, bom em esportes, inteligente e carinhoso, que cuida de todos na família. A irmã é uma rebelde cuja maior transgressão é fazer um piercing na língua. E até o antagonista da história, o astro do basquete que gosta de provocar Victor, não faz nada além de escrever comentários ofensivos na parede. Nenhuma história ou problema é realmente aprofundado.

No enredo, Victor fica claramente interessado no único outro gay da escola, Benji, que convenientemente é lindo, simpático, inteligente e carinhoso, mas que tem namorado. Enquanto luta contra a própria sexualidade, ele decide se forçar a sair com Mia, que, convenientemente é linda, simpática, inteligente e carinhosa, cujo maior problema é aceitar que o pai divorciado esteja namorando uma mulher linda, simpática, inteligente e carinhosa. O melhor amigo dele, apesar de um pouco nerd e bobo, é bonito, simpático, inteligente e carinhoso. Assim como a menina que ele gosta, melhor amiga de Mia.

Faltam química e conflitos reais entre o triângulo amoroso principal (ou quarteto, considerando que o antagonista está interessado em Mia), faltam conflitos reais para deixar tudo interessante, e o resultado é que espectadores (e figurantes) se pegam torcendo mais para um casal hétero de personagens secundários do que para os personagens principais. Quase tudo parece extremamente forçado e irreal.

O oitavo episódio, que traz 3 participações surpresa e é de longe o melhor da série, foi um bom indicativo do potencial que a série poderia tomar – apesar da forçação de barra de fingir que Victor não sabe absolutamente nada sobre o universo queer em uma era onde qualquer pesquisa no Google te ensina mais sobre a vida do que qualquer conversa, e onde RuPaul’s Drag Race é um fenômeno global. Se for renovada para uma segunda temporada, resta torcer para que “Love, Victor” aprenda mais com séries como “Glee” e com o próprio filme original, e use a vantagem de agora pertencer a Hulu para se libertar e se aprofundar de verdade nesse universo.