"Obi-Wan Kenobi" (2022), de Deborah Chow
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7.6

Onde: Disneyplus

 

A trilogia prequel de Star Wars tem muitos defeitos. Dos midi-chlorians aos péssimos diálogos, passando pelo excessivo uso de CGI e algumas escolhas questionáveis de elenco. Entretanto, há muito para ser apreciado nos três filmes que contam a tragédia de Anakin Skywalker. O próprio arco do personagem, mesmo que passe pelo terrível “eu odeio a areia”, é interessante e faz uma metáfora direta com as nossas instituições e a fragilidade com que lidam com as situações mais adversas.

Além disso, George Lucas criou ao longo dos filmes, principalmente dos episódios 2 e 3, um arco político que remetia diretamente ao governo de George W. Bush e as manobras políticas dos EUA pós-11 de Setembro.

E se a questão política, que nunca foi novidade em Star Wars, diga-se, é a parte mais interessante desses filmes, a tragédia de Anakin é a parte emocional que carrega a história. Uma tragédia que dita o destino da galáxia inteira, seja dos Jedi, do Império que ele ajudou a criar com o golpe de Palpatine, da morte de Padmé e, claro, o ressentimento e a culpa do seu mestre Obi-Wan Kenobi. Ewan McGregor carrega grande parte do valor dramático da trilogia, como Obi-Wan, expandindo o papel que foi por menos de um filme de Alec Guinness, mas que sempre marcou o simbolismo de Star Wars.

Não era à toa então que a volta do ator para interpretar Kenobi gerasse tanta ansiedade nos fãs. Além de tudo, o marketing da série vendia o reencontro do mestre e do aprendiz e toda a campanha foi feita a partir do retorno de McGregor e Hayden Christensen.

Entretanto, Obi-Wan Kenobi, a série, passou longe de ser uma história interessante ou ao menos um grande evento dentro da saga de Star Wars. É impressionante o quanto a Lucasfilm tem errado com uma das maiores marcas da história da cultura mundial. O planejamento da trilogia sequel foi uma bagunça, com diversas trocas de direções criativas ao longo dos episódios, o que culminou no pior filme da Saga Skywalker. Teve ainda o desastre completo que foi Solo, com a demissão de Phill Lord e Chris Miller e as refilmagens de Ron Howard. Ainda esse ano tivemos a fraquíssima série sobre Boba Fett, que não deu em lugar nenhum. Desde Os Últimos Jedi, a produtora só acertou novamente em The Mandalorian. E desde lá, já são cinco anos explorando personagens, temas e a bagunça continua a mesma.

 

Uma bagunça?

 

Obi-Wan Kenobi sofreu com os mesmos problemas. A série foi adiada por falta de um roteiro pronto e isso fica visível ao longo dos seis episódios. Sobre o que é a série? Isso não fica claro em momento nenhum. Começa com um drama de amargura e culpa, parte para uma aventura de resgate estabanada que dura quatro episódios e, no último, enfim temos 45 minutos que parecem ser o que a série realmente queria mostrar. É como se o roteiro, que foi escrito a 10 mãos (!!!), partisse da luta final entre Kenobi e Vader e daí sim fosse puxando pontas que pudessem se juntar e justificar o embate dos dois. É tão pobre e tão sem inspiração, que precisa recriar uma cena de flashback para falar algo que todo mundo que assistiu aos filmes já sabia.

E Obi-Wan Kenobi é uma série que tem boas ideias ali no meio: o retiro de luto do mestre que falhou, a ligação entre o mestre Jedi e Leia, justificando um dos pedidos de ajuda mais famosos do cinema, a padawan abandonada, que vê um símbolo aniquilar aquilo que ela acredita… são tantas narrativas interessantes para o universo de Star Wars, mas que nenhuma realmente alcança o potencial. Pelo contrário, os roteiristas acabam criando uma antipatia do espectador com esses temas.

Vale o destaque para todo o arco envolvendo Leia, que foi uma surpresa no primeiro episódio e se tornou um problema sério para narrativa. A personagem que foi central na última trilogia, inclusive explorando os dons dela com a Força, é apresentada como uma criança espertinha, com um ímpeto corajoso e a personalidade que a Leia de Carrie Fisher carregava. Até aí, ótimo. Entretanto, quando ela vira o novo Baby Yoda e repete situações e conflitos com o “adulto da vez”, aí a coisa desanda e transforma Leia em uma criança apenas irritante.

Outros péssimos personagens como Tala, o Grande Inquisidor e Haja tiram tempo de tela e criam tramas paralelas que pouco importam para o que a série deveria focar: Obi-Wan. Todo o conflito do personagem vai e volta de acordo com o que convém ao roteiro e não há um foco sobre o que o motiva nessa jornada toda. Se é por Leia e o ressentimento que tem pela morte de Padmé, se é pela busca de respostas deixadas para queimar em A Vingança dos Sith ou se é, como questiona um personagem no último episódio, apenas uma vontade egoísta de confrontar o antigo aprendiz.

McGregor salva Kenobi, o personagem, do desastre total. O carisma que fez o ator ser tão querido pelos fãs de Star Wars ainda está lá e brilha, principalmente no primeiro e no último episódio. É impossível não olhar para o ator, agora bem mais velho, e não ver o mesmo personagem de Alec Guinness por ali. É facilmente um dos grandes acertos de toda a saga Star Wars.

Obi-Wan Kenobi, a série, não repetiu esse acerto e acaba se tornando mais um produto esquecível da Lucasfilm desde que foi parar embaixo do guarda-chuva da Disney. Personagens fracos, história desinteressante, direção sem nenhuma inspiração e que erra no básico de Star Wars: a aventura empolgante. É como se a Lucasfilm pegasse o pior do que vem acontecendo com a marca, a “fanficzação” das histórias, e, ao invés de corrigir e entregar algo fora da caixa, não, eles repetissem mais uma vez, só que com uma cara mais pobre, sem nem ao menos a graça dos efeitos especiais, das criaturas ou dos cenários diferentes. Pelo menos não apareceu o avô de ninguém por aqui, mas mesmo assim, não tá tudo bem.