Christopher Nolan talvez seja o realizador que melhor represente o atual contexto mundial de ser uma celebridade na era digital. Cercado ou de muito amor ou muito ódio, Nolan construiu uma filmografia estável e bem característica de suas predileções, mesmo incluindo uma trilogia de filme de boneco no meio dela.
Temporização do filme através da montagem, trilha sonora indutora de emoções na encenação e personagens pouco desenvolvidos se comparado às grandiosidades dos temas que abordou ao longo de sua carreira como cineasta. Faltava dar mais um passo enquanto evolução de seu cinema para talvez encararmos um amadurecimento do seu cinema. Faltava.
“Oppenheimer” é um filme clássico do gênero biográfico, mas fala ainda mais sobre martírio de escolhas difíceis por um bem maior, mesmo não sendo reconhecido por tal durante um bom tempo. O rancoroso crítico do século XXI talvez colocasse o filme como um auto-retrato do próprio Nolan usando a história do famoso físico criador da bomba atômica, mas não é o meu caso. “Oppenheimer” transcende o padrão da filmografia de Nolan quando menos esperava.
O protagonista interpretado por Cillian Murphy é o melhor personagem de Nolan no cinema, e claramente não se trata apenas do reconhecido talento do ator. Oppenheimer é uma figura robótica, que relativiza tudo que é humano que lhe cerca (paixão carnal, ideologias, irmandade, humanidade) de forma pragmática, e focado naquilo que o atormenta, que é a confirmação de sua tese na prática como instrumento de defesa contra as opressões mundiais daquele período de tempo (Segunda Guerra Mundial, nazismo).
Além do protagonista, existe cuidado com seus coadjuvantes e muita felicidade na escolha de seus intérpretes. Robert Downey Jr principalmente, Emily Blunt e até mesmo Florence Pugh (apesar de ser talvez o elo fraco do filme pelo pouco desenvolvimento dentro de sua importância na jornada de Oppenheimer ao longo do filme, mas diluída pelo eixo central do que se trata o filme). Mas o mais importante, suas marcas regulares crescem com o adendo de ótimos personagens.
A ótima trilha sonora de Ludwig Göransson se encaixa perfeitamente na proposta de tormento que conduz a trama, dentro daquilo que Oppenheimer sente consigo e com os demais que o cercam. O próprio protagonista ser uma bomba de nêutrons de reflexões morais e técnicas se chocando dentro dele é muito bem ilustrada pela trilha sonora e também na ótima edição de som, além de demarcar a temporização da montagem dos arcos que se desenvolvem em paralelo e se juntam ao final, como em todos os filmes anteriores de Nolan.
A filmagem em IMAX com a fotografia de seu parceiro de longa data Hoyte van Hoytema apenas enriquecem mais o trajeto dramático deste ótimo filme de Christopher Nolan. que sugere uma nova fase do cineasta com cinema evoluído e se afastando de dogmas que talvez reduzam a carnificina do amor e ódio das redes cinéfilas. Quem sabe o amor ao cinema vença no final.