O longa-metragem acompanha Kelly (Gaby Amarantos), uma cantora de forró eletrônico que faz turnê em inferninhos pelo sertão e vai deixando um rastro de mortes pelo caminho. Vítima de um passado abusivo, ela decide matar figuras opressivas que cruzam seu caminho – homens abusadores, estupradores, assassinos. Quando começa a ser investigada pela polícia, transforma sua turnê em álibi, se tornando a primeira mulher serial Killer do Brasil.
Em seu longa de estreia, René Guerra trabalha a figura de Kelly como a anti-heroína feminina, que subverte o sistema patriarcal – misógino e homofóbico – ao fazer justiça com as próprias mãos.
Desta forma, o diretor questiona a flexibilidade moral – legislativa e humana – à medida em que constrói entre espectador e protagonista, uma relação de cumplicidade e empatia.
A questão moral não atinge somente espectadores, mas também as próprias personagens, principalmente a Delegada Fabíola (Paula Cohen), que também luta para se firmar em um ambiente de trabalho extremamente machista e opressor. Desta forma, ela conflita entre o exercício de sua função – prender a assassina – e a sororidade à causa e coragem de Kelly, perante um sistema sócio-político-jurídico machista, lascivo e comprometido.
A exaltação ao feminino é uma constante no trabalho de René Guerra (a exemplo do ótimo “Vaca Profana“, disponível no YouTube), que através de uma narrativa inclusiva e empoderada, exalta a potência humana de suas personagens, tanto sob o aspecto íntimo – em prol de si mesmas; quanto amplo – ao reverberar e incentivar a retomada da posição de controle do feminino – histórica e patriarcalmente reprimida.
Em termos de cinematografia, René Guerra se destaca como um diretor experimental, que não tem medo de explorar cores e ângulos vívidos, buscando por muitas vezes a potencialização das experiências através do estranhamento. Certos momentos ou trejeitos podem, a priori, soar como exagero aos olhos mais afastados do tema macro do filme, entretanto, não se dispersam diante da propriedade e autonomia do diretor quanto a sua história. Experiente preparador de atores, o diretor constrói, com a honestidade e disponibilidade de Gaby Amarantos, uma personagem multifacetada, cuja força motora é a sobrevivência. Sua e dos seus. Uma protagonista feminina empoderada, que se coloca de maneira ativa face a opressão à liberdade, dignidade e autonomia sobre os próprios corpos.
Sendo o cinema importante e poderoso instrumento de transformação social – em um ano periclitante, que se encerra com o disputado fim de um Governo conservador e autoritário; uma Copa do Mundo segregária, sediada pelo preconceito e opressão – a importância de um cinema inclusivo, pró-diversidade, que busque a exaltação do feminino, do humano, e ainda provoque a transgressão e normatização de questões de gênero é, de fato, essencial e louvável.
Serial Kelly | Trailer oficial | 24 de novembro nos cinemas
“Serial Kelly”, de René Guerra, traz Gaby Amarantos em um thriller de comédia musical! Não perca, 24 de novembro nos cinemas! Sinopse: Enquanto cumpre uma agenda de shows em inferninhos pelo sertão, Kelly, uma cantora de forró eletrônico, também vai deixando um rastro de mortes pelo caminho.