"Top Gun: Maverick" (2022), de Joseph Kosinski
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9.8

Onde: Cinemas

 

Em 1987, a Marinha dos Estados Unidos da América teve um aumento de 500% no número de alistamentos. Essa procura foi associada diretamente ao sucesso de Top Gun no ano anterior. O filme foi um fenômeno, principalmente entre os jovens, catapultando Tom Cruise ao status de astro e imortalizando os caças F-14 e Pete “Maverick” Mitchell na cultura pop. O sucesso é fruto diretamente de uma equação que tem, além de Cruise, os nomes de Jerry Bruckheimer e Tony Scott como fatores determinantes.

Bruckheimer foi o grande produtor de ação de Hollywood ao longo de três décadas (1980, 90 e 00s). Filmes como Um Tira da Pesada, Bad Boys, A Rocha, Con Air, Falcão Negro em Perigo e Piratas do Caribe influenciaram diretamente diversas produções do gênero ao longo desse tempo. Já Tony Scott, nunca foi tão badalado quanto o irmão Ridley, mas foi o responsável por pérolas como Maré Vermelha, O Último Boy Scout, Inimigo do Estado e seu último filme, Incontrolável.

A continuação de Top Gun sempre foi pedida por fãs e discutida pelos produtores. Quando ela finalmente começou a andar, o cinema perdeu de forma trágica Tony Scott. Só agora, 10 anos após a morte do diretor, Top Gun: Maverick chega aos cinemas refazendo a equação e juntando Bruckheimer, o diretor Joseph Kosinski e um Tom Cruise que, 36 anos depois do original, se tornou uma força por si só dentro da indústria.

 

E esse Maverick? Tem tudo que um blockbuster precisa?

 

De cara já dá para dizer que, mais uma vez, a equação funciona. Top Gun: Maverick entra na onda das sequências/reboot, como Creed e os novos Star Wars, por exemplo, mas de uma forma diferente: o personagem principal não vira coadjuvante para que uma nova geração possa repetir os seus feitos. Por várias vezes, o filme deixa claro que apenas Maverick é capaz de realizar a missão que ele foi escalado para treinar os pilotos novatos. Kosinski e os roteiristas mostram desde o início que não veremos Pete em um corner de ringue passando instruções para a glória de seus recrutas. Maverick e Cruise não nasceram para ser apoio e isso não é uma novidade desse filme. Se pegarmos todo o caminho do personagem no original, isso já fica bem claro. E se pegarmos a trajetória do astro, idem.

Cruise então começa mais um de seus trabalhos hercúleos, pilotando jatos, correndo, dirigindo motos em alta velocidade e, com seus quase 60 anos, joga futebol americano sem camisa contra os jovens Top Gun do filme. Essa cena, referência/recriação do ícone homoerótico do original, talvez seja o melhor retrato do astro nesse filme. Assim como Maverick, Cruise é o cara que faz o jogo acontecer, apresenta seu físico invejável, marca o touchdown e vai terminar sentado em uma cadeira de praia, sorrindo e satisfeito que sua estratégia deu certo.

Top Gun: Maverick é, mais uma, cereja no bolo do astro, a prova de que (de novo) assim como Maverick, o astro ainda é o às do jogo, o cara que “está mais bonito hoje do que há 30 anos” ou o cara que “aprendeu a pilotar um jato” para fazer o filme. A jornada de Cruise e Maverick se misturam em diversos momentos.

Aliás, é interessante ver o trabalho de Joseph Kosinski, do roteiro e da fotografia do filme para entregar um peso dramático para Maverick. Se em Top Gun, a morte de Goose é o clássico elemento que faz o protagonista cheio de si puxar o freio e contestar seu talento e personalidade, na continuação, Maverick tem plena noção de quem é, do que é capaz e carrega o peso dos mais de 30 anos de serviço na Marinha. Isso vai refletir nas responsabilidades que tem como instrutor do novo grupo e, pessoalmente, com Rooster, filho de Goose, interpretado aqui por Miles Teller. São nesses momentos dramáticos, com a câmera bem mais próxima de Cruise, que o personagem e o ator são humanizados. As rugas, as imperfeições e até os dentes não tão brancos assim nos mostram que ambos já passaram por uma longa estrada e carregam seus pesos.

Entretanto, quando Maverick/Cruise entra no jato, todas essas questões ficam de lado para injetar uma carga imensa de adrenalina e realismo pouco vista no cinema atual. As “loucuras” que Tom Cruise garante nas produções que participa, com stunts em cenários e situações reais, tornaram seus últimos filmes alguns dos melhores do gênero. Todas as cenas de voo no novo Top Gun são no mínimo impressionantes e carregadas de peso e reações espontâneas. Desde a inicial, que deixaria o voo de Matthew McConaughey em Interestelar no chinelo, até o primeiro dia de treinamento de Maverick com os Top Gun ou a cena final, todas tem um trabalho de montagem e edição e mixagem de som incríveis. Em certo momento, quando Maverick tem que se provar para o personagem de John Hamm, me ajeitei na cadeira, igual ao pessoal do filme, de tanta ansiedade.

Top Gun: Maverick é um blockbuster perfeito. É tecnicamente impecável, tem grandes cenas de ação, um protagonista carismático, emoção e muita diversão. Há grandes homenagens ao original, como um encontro que deve emocionar os fãs (e que mais uma vez prova o que escrevi acima sobre Tom Cruise). Toca o tema original, as músicas da trilha de 1986, frases e todo o “fanservice” possível. Entretanto, o filme não se apoia nessa muleta e avança pelo universo criado em Top Gun.

É um cinema com a cara de Jerry Bruckheimer e com todos os elementos que fizeram o gênero explodir em popularidade durante o domínio do produtor. Mas acima de tudo é um filme com a marca de Tom Cruise e, muitas vezes, uma obra sobre Tom Cruise.