Avaliação Hybrido
9Nota do autor
Votação do leitor 7 Votos
8.1

Eis que Daniel Craig, o Bond mais humanizado das 25 produções do cinema, encerra seu ciclo como 007 (seu 5º filme) de maneira formidável, porém com um tom duro, gélido e visceral impresso pelo diretor e escritor Cary Joji Fukunaga, que conta com a colaboração da ácida, polêmica e excelente Phoebe Waller-Bridge (criadora de Fleabag) na produção de seu ousado e fantástico roteiro. O diretor pode ter marcado de vez sua entrada na franquia, tamanha a autenticidade como filma firmemente as ações e como usa as cores assertivamente para produzir toda a atmosfera da simbologia de James Bond.

Fukunaga já havia destilado seu talento ao escrever e dirigir a 1ª temporada de True Detective (HBO), sabendo ser mimetista com a trama que tem nas mãos. Aqui ele inova: exibe duas longas cenas de abertura, bem íntimas e incríveis (fogem da normalidade), além de imprimir um ritmo absurdamente intenso. São tomadas estonteantes na Jamaica e na Itália. Esta obra é a mais longa dos 007, contando com 2h43. Não cansa. A edição e a ação estão concatenadas como deveria ser com películas grandes, ainda mais filmadas em 65mm, quando se pode observar mais pontos da tela imensa.

O diretor sempre sabe quando deve explorar mais sequências viscerais. A quantidade de ação e seus conflitos diversos, mesclados com efeitos práticos (muitas vezes) remetem à qualidade alta de produção como já vimos em “Mad Max – Estrada da Fúria” (2015) e em “Missão: Impossível – efeito Fallout” (2018). Fukunaga ousa e homenageia o cinema do agente, ao trazer elementos de Dr. No, Foguete da Morte e Skyfall.

E A AÇÃO BONDIANA?

Aqui Bond segue aposentado após os eventos de “Spectre” (2015), e está envolvido de forma enigmática com a Dra. Madeleine Swann (Léa Seydoux incrivelmente reservada). Enquanto isso, a organização Spectre, liderada por Blofeld (Christopher Waltz) segue ainda querendo eliminá-lo de diversas formas, o que gera uma das sequências de ação mais frenéticas e lindas da era Craig. Isso na Itália. Logo, seguimos para a Jamaica, e o agente Felix Leiter – amigo de Bond – diz que há uma arma biológica chamada Heracles, de destruição em massa, que está nas mãos dos criminosos de Blofeld.

A busca pela arma se dá na linda Santiago de Cuba e marca a volta de James Bond ao MI6. Lá temos uma ação maravilhosa ao lado de Paloma – agente da CIA (Ana de Armas absolutamente física e investida pro papel, parecia se divertir no processo). E aqui começam os plot twists que conectam a arma a um vilão mais caricato que Blofeld, aparentemente mais sinistro, com maneirismo faciais ótimos: Lyutsifer Safin. Podemos ver que o ator Rami Malek até tenta ser melhor, busca atuar, mas esbarra numa motivação que não é assertivamente fundamentada. O diretor se esforça para emular vilões conhecidos e estrelões da franquia, mas não consegue. Ele claramente pensa nos vilões de Bond da Guerra Fria e naqueles após a queda do muro de Berlim. Mas não emplaca.

Daniel Craig é cinco estrelas. Mesmo com todo absurdismo e sensacionalismo que cercam a série, Craig entrega um Bond mais falho, mais humano, tangível, violento, brutal, algo mais real, ainda que imerso no irreal. Destruindo de vez a figura cavalheiresca e se afastando do super-herói. Destaque para a companhia com a agente 007 que o substituiu enquanto ele estava afastado: Nomi (uma versátil, elegante e violenta Lashana Lynch). Os dois lutando juntos em Cuba têm momentos cômicos e mostra o engajamento de Craig e Lashana de maneira física. Difícil saber quando há um dublê ali.

Fukunaga propõe algo singelo para a obra derradeira de Craig: a continuação (não da franquia, essa sempre vai acontecer; mas da fórmula que dura quase 60 anos). A certeza onírica de que a vida caminha e de que os legados estão construídos. Assim são determinados desígnios naturais do ser humano. Buscamos uma nova era. Terceiro ato de muitas emoções na telona. Muito bem narradas pela câmera do excelente diretor. Ainda que nesse desfecho o ritmo da obra caia um pouco, junto a ele tomba rapidamente também a motivação do vilão Safin, facilitando uma resolução narrativa de maneira desnecessária. Isso não diminui a tradução do lindo tributo à série do espião mais assistido da 7ª arte.