Nostalgia. É realmente esta a palavra que define o remake do Aladdin de Guy Ritchie. A princípio contava com aquele olhar de muita desconfiança em relação a seus trailers. Ele apresenta poucas falhas, mas de fato diverte em uma experiência que nos coloca em 1992 outra vez. A notável desordem das redondezas de Agrabah da animação não se vê tão presente aqui. Isso é sentido. Lá na década de 90, a ambientação minimalista da cidade traduzia a correta ideia da diferença que se tinha entre o palácio e seus súditos. O diretor britânico agora cria uma Agrabah um tanto mais chique, estilizada e mais higienizada. Ritchie se preocupa aqui em nos passar aquele “olhar familiar”, como este filme nos parece ser o tempo todo.
A obra de Guy Ritchie possui 2 horas e 8 minutos de duração. São bons 38 minutos a mais que a animação e funcionam bem. Com a ajuda do também roteirista John August, o filme recebe novas camadas. São elementos que se destacam e conseguem enriquecer ainda mais esta película, como a nova personagem – Dália – que cuida da Princesa Jasmine e a aconselha sempre como grande amiga. Existe também o Príncipe Anders, que surge aqui interessado em se casar com Jasmine. Dália (Nasim Pedrad) e Anders (Billy Magnussen) dão conta de bons momentos cômicos ao longa. Vale ressaltar que desta vez a moderna Princesa Jasmine de Guy Ritchie é apresentada como uma líder empoderada que quer governar seu reino em Agrabah.
A ótima atuação da britânica Naomi Scott – que possui descendência indiana e dá vida à Princesa Jasmine – é percebida na obra no momento em que ganha a tela. Seu poder é de fato notado em um dos novos elementos narrativos do filme: a inédita música Speechless. O compositor americano Alan Menken – que já trabalhou para Disney em filmes como A Bela e a Fera – assina a trilha aqui e prepara esta canção pensando na criação da forte rival do vilão Jafar.
Este live-action conta quase a mesma história de 1992. Aladdin é um ladrãozinho das ruas de Agrabah que – numa de suas aventuras – conhece Jasmine e se apaixona por ela. O que o jovem não sabe é que aquela plebeia disfarçada é a princesa, filha do sultão. A forte Jasmine aqui pretende governar e não se casar com príncipes fúteis que aparecem ao Sultão a fim de comprá-la. Jafar, o poderoso e ambicioso vizir do sultão, manipula todos para assumir o controle do reino. Para isso, ele cobiça a preciosa lâmpada mágica da caverna das maravilhas e seus famosos 3 desejos. O ardiloso vizir engana meninos de rua os fazendo entrar na tal caverna com formato assustador de um tigre a fim de alcançar a desejada lâmpada. Ao ver Aladdin dentro do palácio, Jafar o retira a força e o leva até a caverna, onde o ladrãozinho fica preso. Mas é aí que o grandioso gênio de Will Smith – ponto gigante do filme – aparece a fim de ajudar Aladdin a sair dali e a conquistar a linda Jasmine.
O egípcio-canadense Mena Massoud, que interpreta Aladdin, é fiel àquele da animação. Mesmo em características físicas. Ele entrega um bom trabalho em meio a seus movimentos de “parkour” pelas paredes de Agrabah e aos números musicais. Não acho que convence no início da canção tema “A whole new world” como o ator Brad Kane (Aladdin de 92) o fez. No entanto, a Jasmine de Naomi Scott controla de maneira satisfatória e com segurança todos os números. Ela tem a compostura e a presença de princesa que as músicas pedem. Também tem a voz com a qual a Disney sempre nos encantou. É positivo ver Guy Ritchie em sua obra escolher um elenco composto por uma diversidade de etnias. Isso foi um processo demorado. Apenas atores brancos – como teria sido ventilado em alguns portais – faria mal ao roteiro.
Will Smith realmente toma conta do longa. O gênio dele não replica o de Robin Williams (Gênio de 92). Mas ele cria seu próprio personagem azul. Havia a preocupação de que Smith poderia ser uma versão pior que aquela conhecida e cheia de trejeitos cômicos de Williams. Aqui Smith traz à tona a magia de Robin Williams, mas o faz à sua própria maneira. Por exemplo, na canção “Friend like me”, o versátil Will Smith conta em diversas entrevistas que incorporou um tanto do hip-hop que assinava no início de carreira em “Um maluco no pedaço”.
A parte em que o filme desliza fortemente é toda do fraco vilão Jafar. O holandês de família tunisiana, Marwan Kenzari, em nada chega perto do mago vizir de 1992. Na animação ele era frio, calculista, assassino inescrupuloso, mago manipulador e assustador sempre que tocava seu ameaçador cajado. Além de não se constatar nada disso aqui na obra de Guy Ritchie, Kenzari não imprime voz, nem presença em cena ao Jafar da vez. Tampouco o papagaio Iago é irônico como era no desenho. Sendo assim, ele se torna um adversário fácil de ser derrotado pela Princesa Jasmine. Vale dizer que a ruim atuação ofusca até Will Smith. Quando ele contracena com o Gênio de Smith, o ponto alto da obra é calado. O filme sofre.
O Aladdin de Guy Ritchie é bom. Em momento algum ele quer ser superior ou se comparar ao de 1992. Vale conferir toda a magia da Disney, que executa aqui uma bela montagem, mesmo com este diretor britânico tão autoral em algumas características. É até possível verificar bem pouco de Guy Ritchie em alguns trechos do longa. Como em algumas fugas, alguns movimentos acelerados e acrobáticos nas ruelas de Agrabah e em algumas transições de cenário. No geral, nem nos damos conta de que estamos diante do criador de “Jogos, trapaças e dois canos fumegantes”. Mas tudo converge a um mundo de fantasia que nos faz cantar juntos e sair do cinema com aquela palavra do início do texto: nostalgia.