Rita (Glória Pires) é uma compulsiva consumista e acumuladora que está com seu vício sob controle há sete anos. Aceita inclusive retornar ao seu grupo de ajuda, mas desta vez, na posição de coordenadora, utilizando sua história de superação como base inspiradora aos demais.
Tudo vai muito bem até que sua talentosa filha Duda (Maisa), com quem tem uma relação muito próxima e amorosa, consegue uma bolsa de estudos para cursar fotografia no exterior. A iminência da partida de sua filha é o gatilho suficiente para desencadear seu vício adormecido.
Desta forma, ela trava uma luta consigo, junto com os demais, para que não caiam na tentação da utilização do consumo como válvula de escape para questões mais profundas.
O assunto é extremamente presente em nossa sociedade pós moderna, em que a felicidade é objetivo-fim e o meio se dá através do consumismo, inserido ininterruptamente diante da voracidade do capitalismo. Sendo assim, facilmente, felicidade e consumismo se confundem. A busca pelo bem estar, pertencimento e destaque se materializa pelo consumo.
Diante de um tema psicológico tão profundo, o diretor Hsu Chien, também responsável pelo argumento do filme, consegue extrair leveza de forma consciente e humanizada, o que torna a comédia interessante.
Sem se aprofundar na psicologização do assunto, as personagens são permeadas pelo esteriótipo arquetípico costumeiro de grandes comédias nacionais, mas são preenchidas com sentimentos reais e contraditórios, o que as humanizam.
Ainda, há um contraponto interessante no jogo entre mãe e filha. Rita permanece em constante oscilação, decorrente de sua doença, enquanto a lucidez é advinda de Duda, que serve quase como um ponto de aviso, de lembrança, para que Rita encontre seu auto controle.
A co-dependência psicológica entre mãe e filha é o que justifica também a desestabilização de Rita diante da notícia da partida da filha. Assim, sutilmente, o filme nos traz outra camada, que é o caminhar da adolescência para vida adulta e o consequente rompimento do cordão umbilical.
Diante de tantas propostas, o filme consegue nos apresentar momentos de reflexão, tendo como base a leveza e o humor. Este último, é constante na narrativa e muito bem construído através de personagens que funcionam livre e divertidamente em seus núcleos, como tem de ser. Aliás, destaque para a escolha dos núcleos, que, apesar de polarizados, se conectam de forma interessante, principalmente pelo talento e traquejo com comédia. Destaques para Malu Valle e Marcos Pasquim, que conseguem implementar a comédia mais expansiva e corporal de forma orgânica, natural e engraçada.
Desde sua última direção, “Quem vai ficar com Mário?”, Hsu Chien vem se mostrando um diretor que sabe como se utilizar da leveza e diversão para propor reflexões de temas sensíveis e necessários, e o resultado, no caso de “Desapega!” é uma comédia com um tempero extra: divertida e sobretudo, humana.
Desapega! | 9 de fevereiro nos cinemas
Após sete anos controlada de seu vício em compras, Rita (Gloria Pires) assume a liderança de um grupo de apoio a compradores compulsivos para ajudar outras pessoas a darem a volta por cima. Começando um novo romance com Otávio (Marcos Pasquim) e toda trabalhada no equilíbrio, parece que nada pode apagar o seu brilho.