“Há algo errado entre homens e mulheres”.
A constatação franca, cirúrgica, dolorida e óbvia, proferida pelo investigador Yohan (Bastien Bouillon) dita o tom de “A Noite do dia 12”.
Ao investigar a morte de Clara, uma jovem de 21 anos que foi queimada viva, ele se depara com a violência da misoginia perpetuada por décadas de um modelo de sociedade patriarcal.
Como protocolo de investigação, ele reconstitui a vida amorosa da vítima, em busca de pistas pelo assassino. Aos poucos, o investigador se dá conta do ambiente machista, extremamente relativizado e normatizado, que é reverberado por todos os homens – suspeitos, policiais, e até mesmo por ele, quando da condução de sua investigação.
Assim, a narrativa que começa sob uma simples investigação criminal, se amplifica em sóbrias e complexas camadas, ao passo em que a identidade do verdadeiro assassino é, em determinado momento, colocado em plano secundário, diante da gravidade do cerne da questão – estamos perpetuando uma sociedade gravemente machista, julgadora e opressora de mulheres e outros gêneros e a “justiça” nada mais é do que espelho desta sociedade.
A sensação de incômodo é predominante no filme, porque a máxima que sobressai é a fatídica e verídica constatação de que nossas instituições de poder não estão capacitadas a atuar e lidar com questões de gênero, e costumeiramente conduzem a problemática através da atribuição de estereótipos, fazendo com que a vítima seja revitimizada.
O assunto é desenvolvido de forma sensível, fluida e sem didatismos, com figuras femininas centrais que instituem o questionamento acerca da problemática. A própria vítima, Clara, é a figura feminina que, além de fato gerador para o desenvolvimento da trama, acaba assumindo o protagonismo quanto à questão desenvolvida, a partir do momento em que deixa de ser o objeto do mistério para ser a figura “marco” de uma discussão macro e imperativa.
Desta forma, as jornadas das personagens – vítima e investigador – se cruzam, de início pelo crime em si, e depois, de forma significativa, através da transformação (ou não) de todas as personagens, bem como do meio social que as cerca.
O incômodo, já citado neste texto, é sublinhado ao sabermos que a história é baseada em fatos reais, de um caso proveniente do livro da escritora Pauline Guéna. A concretude do caso nos remete imediata e inevitavelmente a tantos outros que acompanhamos nos noticiários. Por isso, louvável a abordagem justa, franca e sensível com a qual o assunto é desenvolvido, reforçando o cinema como ferramenta de entendimento e mudança social. Um filme que nos convida a refletir e debater um assunto extremamente urgente e necessário.
A Noite do Dia 12 – Trailer Oficial
No Description