Avaliação Hybrido
9Nota do autor
Votação do leitor 2 Votos
9.9

Apesar de ser um dos heróis com maior quantidade de versões cinematográficas, Batman é ao mesmo tempo um dos menos valorizados enquanto construção de personagem num filme. Até este “Batman” (2022) dirigido por Matt Reeves, que é realmente um filme essencialmente sobre o Batman, mas não necessariamente um milionário vestindo um uniforme e combatendo o crime, mas o Batman enquanto representação da psiquê de um sujeito atormentado pela raiva e rancor.

O primeiro ato é brilhante na construção do que significa o Batman para aquela sociedade de Gotham City e para o próprio condutor dessa figura justiceira, vigilante: o combate do crime pelo medo, pela vingança. Toda a cosmologia do filme é muito bem delineada pelo design de produção, fotografia, trilha sonora, escolhas criativas ao longo das cenas de ação, e essa cosmologia se mostra o grande oponente de Bruce Wayne para vencer seu problema na narrativa: superar seus traumas.

Este Batman demonstra suas habilidades ainda “verdes” enquanto detetive (enfim o verdadeiro Batman das HQs representado), mas sempre se coloca à beira do caos em suas próprias atitudes, sempre flertando com ações quase suicidas e nada premeditadas, no borderline de até onde a raiva pode consumir um sujeito. Está tudo ali, e Reeves reforça esse tom sombrio jogando esse protagonista em meio a uma trama que delineia o melhor do neo-noir de David Fincher no plot central (a busca de um serial killer bizarro, representado no Charada)

A trama também traz um pouco de faroeste nos trejeitos do herói (o andar vagaroso, a pisada impactante das botas, os closes no olhar do herói fraturado) e muito de terror, através de imagem (escuridão) e som (na ação, nos passos dos personagens, no ronco do motor do novo Batmóvel). A associação dos dois gêneros logo me remete à cena final de “O Estranho Sem Nome” (1973, Clint Eastwood), onde o forasteiro sacia sua vingança em uma cidade pintada de vermelho.

Vermelho que aliás é o tom dessa psiquê de um Batman buscando uma saída pro legado do pai, que a cada crime é vilipendiado pelo jogo psicológico de um vilão cujo objetivo em muito se assemelha ao do próprio herói e o que empurra o filme para o caminho da redenção, para encontrar o caminho do heroísmo puro que a aquela cidade precisa.

Porém, a redenção é uma camada que Hollywood impõe em suas produções voltando para o público infanto-juvenil que consome bonecos e itens, para vender seu negócio. A verdade é que Batman nunca será sustentado em suas reais contradições dramáticas em Hollywood, mesmo aqui sendo o mais humano em todos os seus aspectos já representado no cinema. Um filme ótimo que infelizmente não abraça completamente o lado sombrio que sempre é a força motriz deste personagem, e não precisa ser necessariamente superado para fazer sentido dramaticamente.