Avaliação Hybrido
8Nota do Autor
Votação do leitor 2 Votos
7.4

Falar de “Blonde” (2022) demanda introdução sobre o momento que vivemos, e diferente da maioria, não se trata do que o filme denuncia de forma surrealista e com uma mão pesada, de como se trata o mundo das celebridades até hoje, e como esse mundo é um matadouro de mulheres na indústria machista de Hollywood. Este texto não vai na corrente de matar o mensageiro, mas no papel da arte de provocar – mesmo que de forma desagradável e incômoda para cumprir seu papel.

Não li nada específico sobre a vida de Norma Jean Baker/Marilyn Monroe, e pra mim pouco importa o material-base de qualquer filme, desde que conte sua história através dos elementos do cinema, e nesse ponto Dominik conduz tudo muito bem como em seus filmes ficcionais anteriores – “O Assassinato de Jesse James Pelo Covarde Robert Ford” (2007)  e “O Homem da Máfia” (2012) – esbanjando talento em construir a cosmologia de seus filmes, em “Blonde” se aproveitando demais dos momentos icônicos de sua protagonista, com ousadia e sem medo de julgar a iconoclastia envolvida no que se trata de Marilyn Monroe.

E na premissa de “Blonde”, a sua protagonista já nasce condenada pelo sangue, desde o verdadeiro batismo de fogo onde sua mãe mentalmente perturbada, consumida por ilusões tóxicas de endeusamento do seu ex-amante e pai da protagonista, a desnuda na água escaldante. Desde aquele momento enxergamos que Norma é a persona desnuda de Marilyn, o personagem estruturado por ela para encarar o seu desamparo no seu trabalho de atriz que todos conhecem e “amam” – entre aspas pois a idolatria não necessariamente se resume à paixão, assim como a fama não corresponde necessariamente felicidade, e a encenação é densa e pesada em demonstrar isso.

O filme é rico também em momentos de onirismo, nas expressões tristes de sua protagonista em cenas clássicas de seu sorriso, talvez para já ilustrar aquela Norma que vivia por baixo da estrela Marilyn, ou nas distorções do que ela enxerga para além dela, progressivas conforme o filme avança e a protagonista definha pelo universo que a cerca e pelo lastro genético que carrega.

O filme acaba perdendo um pouco a mão no excesso, e num filme com quase trẽs horas isso torna a narrativa mais morosa do que um drama pesado exige de sua torturada protagonista, e aqui Ana de Armas se destaca para além da mimetização vivendo aquela personagem para além da maquiagem que a própria Norma Jean utilizava para se tornar Marilyn, e se entregando à proposta ousada que Dominik apresenta sobre um ícone, e se atrai discussão é justamente por ter cumprido o papel provocador que arte necessita para seguir viva.