A série “American Crime Story” é um projeto onde em cada temporada se aborda um crime específico e notório na história recente dos Estados Unidos. Na primeira abordou-se o caso de O.J. Simpson, e na segunda o assassinato de Gianni Versace, e seu criador Ryan Murphy nos traz aqui o caso de impeachment que o ex-presidente Bill Clinton enfrentou nos anos 90.

Assim como na primeira temporada Murphy usou o caso de O.J. Simpson para estampar uma crítica à influência da mídia no judiciário norte-americano, aqui existe uma máscara de expor a forma inescrupulosa do uso do judiciário em prol de oposição política a um mandatário, mas de fato esta temporada expõe de forma bem distribuída diferentes formas do uso da mulher enquanto instrumento de ascensão e/ou manutenção do poder – seja por homens, pela sociedade como um todo, ou até mesmo por outras mulheres.

Ao longo da temporada vemos o lastro do comportamento sexual de Bill Clinton através de processos e inquéritos, primeiro através de Linda Jones, uma ex-funcionária de Arkansas que denuncia Clinton em seu período como governador. E em cima da notoriedade deste processo – impulsionado por interesses oportunistas do marido de Jones na midiatização do crime sofrido pela esposa, e posteriormente por uma militante “feminista conservadora” (palavras da personagem) em busca de seguidores – se inicia o imbroglio central desta temporada, o incidente envolvendo o presidente norte-americano e a estagiária Monica Lewinsky.

A manipulação deste caso extraconjugal por outra funcionária pública do Governo e “amiga” de Lewinsky, Linda Tripp, é o que move esta temporada em frente, e como Tripp usa da ingenuidade da então colega para preencher o vazio do que sofre no seu dia-a-dia ao ser esvaziada pela aparência e falta de traquejo social, tentando ser protagonista de sua própria história mesmo a custo da vida de outros.

E por fim, na reta final da temporada, se aborda também o papel da então primeira-dama, Hillary Clinton, lidando com a exposição pública das relações extraconjugais de seu marido e como isso rui o projeto familiar dos Clinton, e como ela também é usada como escudo moral do presidente na resposta e nas reações aos ataques à Bill Clinton através de procedimentos judiciais liderados pelo promotor conservador Kenneth Starr.

Em menor escala temos também o retrato da promotora usada no depoimento para colher detalhes dos encontros entre Clinto e Lewinsky, o nascimento da mídia independente e sua influência na imprensa tradiconal, ou como é tratada a denúncia de possível estupro de Bill Clinton a uma funcionária de sua campanha para governador na organização da ação de impeachment, tudo nos leva à oposição de recordar esse momento à época dos acontecimentos, como retratavam o caso por aqui e como nos lembramos dele até ver a série.

Esta temporada inteira, ao tratar com detalhes a escalada dos acontecimentos que levou ao processo de impeachment, e de acordo com o perfil das pessoas envolvidas através do arco dramático, deixa claro o sentido da série de expor o quanto se explorava a mulher como joguetes do jogo de poder da política através de judiciário e midia, e o quanto pouco disso mudou ainda hoje, quase vinte anos depois. Uma série necessária e um tando didática sobre o quanto é importante sempre expor o machismo de nossa sociedade.