OS REJEITADOS (THE HOLDOVERS), de Alexander Payne
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É fácil se deparar em catálogos de streaming com filmes sobre aprendizado e evolução, através da troca inesperada e horizontal entre dois pontos distintos de uma relação de hierarquia. Temos tido nos últimos anos uma jorrada de filmes categóricos, rasos, rápidos, formulados especificamente para o preenchimento de determinados padrões estatísticos. Estatísticos mesmo, de estatística, que é muitas vezes como o espectador é tratado.

Os rejeitadosfoge completamente desse padrão e chega para matar a saudade do ótimo cinema de conteúdo, que atravessa, humano.

Em um colégio interno tradicional, Paul Hunham (Paul Giamatti, em mais uma de suas inúmeras irretocáveis atuações) é um professor rígido, que exige demais da vida e de seus alunos. Durante o recesso de natal, é costume que o colégio permaneça fechado e os alunos retornem às suas famílias.

Ocorre que alguns dos alunos não tem como retornar e precisam permanecer no colégio.

Sr. Hunham é designado, então, pelo diretor como o tutor dos mesmos, e ele e os alunos terão de se entender, ainda que a contragosto, para que consigam conviver. Ou vice e versa.

O contragosto é geral, já que cada um dos envolvidos está lidando questões próprias, o que já começa a traçar o universo particular/singular de cada um.

A cozinheira do colégio Mary, interpretada por Da’Vine Joy Randolph (ganhadora do Globo de Ouro por sua atuação) está em luto por seu filho, recém morto em combate, na Guerra do Vietnã.

Já Angus (Dominic Sessa), lida com a indiferença de sua mãe, que está refazendo a vida após a viuvez.

Hunham, por fim, tem de lidar com a armadura criada por ele para se proteger da vida.

Ou seja, temos pessoas extremamente diferentes, presas durante o recesso de Natal e forçadas a se relacionar.

Premissa relativamente simples, se não estivéssemos falando de  Alexander Payne. Tendo no currículo filmes como “As Confissões de Schmidt” (2002); “Sideways” (2004), “Os Descendentes” (2011), o diretor é um dos mais certeiros no que se refere a destrinchar a complexidade das relações humanas.

Partindo de narrativas aparentemente descomplicadas e acessíveis, ele mergulha nas profundezas dos sentimentos humanos, que tentamos esconder ou ignorar – tristeza, ego, solidão, raiva, culpa, superioridade, basicamente aquele combo de sentimentos que tratamos (ou que pelo menos deveríamos ter a condição de tratar) em terapia.

Payne se utiliza da estética dos anos 70 para situar sua narrativa.

Uma ótima escolha, no que diz respeito à cronologia, uma vez que situa a história sob uma época de incertezas, tendo como pano de fundo a Guerra do Vietnã, estabelecendo assim um paralelo subjetivo e instrínseco entre a guerra, as desconexões humanas e o individualismo, que permeiam as relações.

E ainda, também no que diz respeito às escolhas de posicionamento de câmera, que oscilam entre a amplitude, com quadros abertos, e o minimalismo, com uma câmera estática e intimista.

Como resultado, acompanhamos tanto a grandiosidade que cerca as personagens, bem como o íntimo das mesmas, o que reverbera a sensação do que é se sentir sozinho em meio a uma imensidão – de gente, de espaço, de possibilidades.

O diretor explora ainda o pré-julgamento e o preconceito como elementos limitadores.

Tudo isso, através de ótimos diálogos e personagens carregados de ironia, timingo cômico e tormentos próprios, mas com muita, muita humanidade. É justamente nesse ponto em que todos se entrelaçam.

Não à toa, o filme surge como favorito em premiações, com destaque para as atuações.

É definitivamente um filme para ver e ser absorvido pela magia de um cinema que nos toca e nos atravessa.

 

Os Rejeitados | Trailer 1 Oficial

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