França, 1963. Anne Duchesne (Anamaria Vartolomei) é uma estudante extremamente aplicada e obstinada, que se surpreende com uma gravidez inesperada. Prestes a entrar na universidade, se vê diante da impossibilidade de ter um filho, o que resultaria no abandono de seus estudos. Então, ela começa uma jornada solitária para realizar um aborto. Na época em que o filme se passa, o aborto é ilegal e, portanto, assunto proibido por parte dos médicos, e velado e rejeitado por parte de conhecidos.

Conforme as semanas passam, ela vê suas possibilidades cada vez mais estreitas e procura como fazer um aborto clandestino. A narrativa se dá como uma contagem regressiva para a decretação da sentença de Anne – abortar e seguir com suas vontades ou sucumbir ao fardo de seu destino não planejado.

Importante destacar que de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), até hoje, seis de cada 10 gravidezes não programadas acaba em aborto induzido e a estimativa é que cerca de 45% dos abortos feitos ao redor do mundo sejam inseguros.

Partindo da temática do aborto, o filme reverbera de forma ampla questões imprescindíveis da problemática acerca da democracia do corpo da mulher. A questão é inevitavelmente ligada ao aborto, mas reverbera em assédio – sexual e moral – violência contra as mulheres, e exploração histórica de corpos femininos, provenientes da posição da mulher perante uma sociedade patriarcal. Estamos falando do cerceamento de direitos e controle do Estado sobre a liberdade sexual das mulheres e as decorrências disso.

Com a utilização de uma câmera mais aproximada, o sentimento de angústia predomina e aumenta a cada frame, e a história culmina numa exasperada luta por liberdade. Como tal, é recheada de injustiça, sofrimento, dor. Mas também de determinação e força motora da transformação, peculiar às mulheres.

A história é baseada no livro de mesmo título, escrito por Annie Ernaux, num relato semi-biográfico e foi adaptada pela diretora Audrey Diwan, que leu o livro após ter realizado um aborto. Duas mulheres, donas de si, que reverberam essa história para que tantas Annes possam se sentir acolhidas, reafirmadas, e incentivadas a tomar a mais firme e importante decisão da vida: a de serem donas de suas próprias escolhas.

Filme necessário, imprescindível e que realmente faz juz ao próprio título.

Está em exibição pelo Festival Varilux de Cinema Francês e estreia em todos os cinemas nesta quinta-feira, dia 07.